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O que acontece depois do Burnout?

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Reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma síndrome ocupacional desde 2019 e, no Brasil, equiparado a acidente de trabalho, o Burnout deixou de ser apenas um alerta de saúde mental para se tornar também um tema estratégico dentro das empresas.

Mas se os debates geralmente giram em torno da prevenção, cresce a necessidade de entender outro ponto crucial: o que acontece depois que o colaborador já passou pelo Burnout e retorna ao mercado de trabalho?

Reabilitação do Burnout exige mais que descanso

O retorno ao trabalho após a síndrome não é imediato nem simples. Especialistas explicam que a recuperação vai muito além de repouso: envolve terapia contínua, muitas vezes com abordagem cognitivo-comportamental, acompanhamento médico e ajustes na rotina.

De acordo com Jair Soares dos Santos, fundador do Instituto Brasileiro de Formação de Terapeutas (IBFT) e criador da Terapia de Reprocessamento Generativo (TRG), “o Burnout não é apenas um episódio de cansaço extremo. É resultado de sobrecarga emocional, expectativas irreais e ausência de pausas reais. Tratar apenas os sintomas é ignorar a raiz do problema”.

Segundo a OMS, mais de 77% dos trabalhadores brasileiros relatam já ter sofrido algum sintoma de estresse crônico relacionado ao trabalho. Desses, uma parcela significativa evolui para a síndrome, que pode gerar afastamentos longos. O desafio surge justamente no retorno: como reintegrar sem provocar uma recaída?

A orientação é que o processo seja gradual, com jornadas reduzidas, tarefas redistribuídas e acompanhamento próximo. Pausas durante o dia, flexibilidade de horários e até mesmo a possibilidade de home office podem fazer a diferença nessa fase.

“Quando não se reprocessa a causa emocional, o organismo permanece em estado de alerta, e qualquer nova pressão pode reacender o quadro”, explica o psicólogo, que também destaca a TRG como um importante suporte. “A TRG é aplicada em diferentes contextos laborais e propõe identificar e neutralizar gatilhos emocionais por meio de protocolos que revisitam, de forma segura, memórias e experiências associadas ao esgotamento”, explica.

Sequelas que podem permanecer

O Burnout não termina com o fim do afastamento. Pesquisas mostram que a síndrome pode deixar marcas físicas e cognitivas duradouras: aumento de risco cardiovascular, obesidade, diabetes, além de impacto na memória, na capacidade de concentração e na agilidade cognitiva.

Isso significa que, mesmo após o retorno, o colaborador pode não ter a mesma produtividade imediata de antes, exigindo da liderança e do RH um olhar cuidadoso e humano.

“Produtividade sem pausa cobra um preço alto. Quando o Burnout não é tratado na raiz, ele volta, e muitas vezes, mais intenso. O descanso não é luxo, é parte essencial da cura”, salienta Soares.

O dilema de voltar à mesma empresa

Um dos pontos mais delicados é quando o colaborador retorna à organização onde o Burnout se instalou. Muitas vezes, a cultura, a liderança ou o ritmo de trabalho foram gatilhos para a síndrome.

Com mais de 20 anos de atuação em RH, a psicóloga organizacional e precursora do conceito de segurança psicológica no Brasil, Patrícia Ansarah, salienta que “empresas que investem em ações preventivas, como treinamentos, canais de escuta ativa, apoio psicológico estruturado e capacitação de liderançassaem na frente”. Casos de Burnout são pontos de atenção para que gestores revejam a cultura do negócio, o desempenho das lideranças e o papel ativo – ou não – do RH.

Além disso, a fundadora do Instituto Internacional em Segurança Psicológica (IISP) destaca que alguns públicos podem ser ainda mais impactados por contextos corporativos que se distanciam do bem-estar e da qualidade de vida.

“Há, ainda, recortes que não podem ser ignorados. As mulheres, por exemplo, enfrentam com mais frequência sobrecarga emocional, microagressões e assédio. São também as que mais adoecem mentalmente no ambiente de trabalho, em razão de cobranças silenciosas, muitas vezes invisíveis.”

Do ponto de vista legal, o tema também é sensível: por ser considerado doença ocupacional, o Burnout garante estabilidade de até um ano após o retorno quando o afastamento é reconhecido pelo INSS como relacionado ao trabalho. Isso significa que a empresa precisa não apenas reintegrar, mas também criar condições reais de acolhimento.

O papel do RH no pós-Burnout

Para minimizar riscos e garantir um retorno saudável, a recomendação é que o RH atue em três frentes:

  1. Planejamento individualizado: construir um plano de reintegração junto ao colaborador e ao médico responsável, ajustando a carga de trabalho.
  2. Cultura organizacional: investir em treinamentos de liderança, promover a segurança psicológica e reduzir o estigma em torno de transtornos mentais.
  3. Políticas estruturadas: implementar programas de saúde mental, incluir riscos psicossociais no Programa de Gerenciamento de Riscos (exigência da NR-1 desde maio de 2025) e documentar todas as ações preventivas.

O Burnout não termina no atestado médico. O pós é uma fase crítica, que exige tanto atenção clínica quanto mudanças culturais e estruturais dentro das empresas. Se, por um lado, o colaborador precisa de tempo e apoio para retomar sua saúde e confiança, por outro, o RH e as lideranças devem assumir o compromisso de não repetir os erros que levaram ao esgotamento.

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